Bolsonaristas ampliam adesões a anistia com teor de projeto no escuro

Nas últimas semanas, o PL, partido de Jair Bolsonaro, fez pressão para aumentar as adesões à urgência do projeto de lei que anistia os envolvidos no 8 de janeiro, com o objetivo de que o texto possa tramitar de modo mais célere.

O apoio não está sendo coletado, entretanto, a partir do endosso a um texto já articulado e amadurecido.

Deputados consultados pela Folha que já apoiaram a urgência ou que estão à frente das articulações –parte deles sob reserva– fazem afirmações na linha de que o texto será debatido posteriormente. Também não há uma fala única a respeito de qual versão do texto seria a base das discussões.

Há quem diga que a tendência é que o texto siga a linha de parecer apresentado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) no ano passado, ou que parta do texto originalmente apresentado em 2022. Além disso, há divergências sobre a abrangência da anistia que deveria ser aprovada.

Versões apresentadas até aqui poderiam, em tese, beneficiar também o ex-presidente.

Na noite da última quinta-feira (10), o líder do PL na Casa, o deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), afirmou que a meta de 257 assinaturas foi alcançada. A decisão de pautar ou não a urgência, no entanto, depende do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB).

Após uma semana de obstrução e de ato na avenida Paulista, em São Paulo, com discursos mirando o presidente da Casa, o PL decidiu recuar da estratégia de emparedamento.

Motta, por sua vez, tenta construir um consenso entre os Três Poderes para reduzir a pressão pela aprovação da proposta —vista como uma afronta ao STF (Supremo Tribunal Federal) e possível gatilho de uma crise institucional.

Já Bolsonaro, após conversa com Motta nesta quarta-feira (9), mandou seu partido estudar alternativas para diminuir resistências ao projeto na Casa, frente à avaliação de que deputados acham que as penas impostas pelo Supremo foram duras, mas que é preciso punir quem tenha depredado as sedes dos três Poderes.

O substitutivo apresentado na CCJ em 2024, que atualmente não tem validade, já excluía da anistia crimes como lesão corporal e dano a coisa com valor artístico ou histórico. Ele tinha sido apresentado pelo relator Rodrigo Valadares (União Brasil-SE), deputado alinhado a Bolsonaro, antes de Arthur Lira (PP-AL) decidir criar uma comissão especial e retirar o caso da CCJ.

Ele previa anistia aos que participaram de manifestações em 8 de janeiro e também “a todos que participaram de eventos subsequentes ou eventos anteriores”, desde que mantenham correlação com os eventos citados.

Entre deputados que assinaram a urgência ouvidos pela reportagem, há quem classifique o debate sobre qual seria a abrangência e os limites da anistia como ainda muito vago. Segundo o gabinete de outro parlamentar, a urgência deveria ser entendida como relativa ao tema da anistia, e não à redação do projeto. Um outro diz que, caso a proposta vá ao plenário, pretende apresentar uma emenda para impedir que a anistia se aplique a Bolsonaro.

Caberia a Motta indicar o relator da proposta no plenário, que é quem apresentaria um novo texto substitutivo a partir das negociações na Casa. Como mostrou a Folha, Valadares é cotado, mas não é o único nome.

Questionado pela Folha sobre em que medida haveria já um acerto sobre o texto do projeto nas conversas para coleta de assinaturas, Sóstenes Cavalcante disse que ainda não tinha chegado nessa discussão.

“Não, nem cheguei nisso ainda, nós estamos enfrentando uma batalha tão grande que primeiro é pautar urgência. Texto se discute a posterior”, afirmou um dia antes de ter atingido a meta.

Ele discorda, porém, que haja indefinição: “Não acho que tem indefinição. Anistia por si só, a palavra fala”. E adiciona que, como todo e qualquer texto, ao passar pelo plenário, ele pode ter “ajustes para ampliar a anistia ou para minorar”.

Perguntado se o projeto incluiria Bolsonaro, ele respondeu: “Lógico que não. Ele não é transitado em julgado, ele não tem condenação. Como é que nós vamos anistiar alguém que não está condenado ainda?”

O deputado Capitão Augusto (PL-SP) também afirmou que o primeiro passo agora é aprovar o requerimento de urgência, para depois então se trabalhar para obter consenso em torno de uma proposta. Pessoalmente, ele se diz favorável a que a proposta inclua anistia ao ex-presidente Bolsonaro.

Valadares também afirma que o texto ainda será discutido. Segundo ele, os pontos mais consensuais iriam na linha de anistiar as pessoas das penas de golpe de Estado e de abolição do Estado democrático de Direito, mas não da punição por depredação.

Questionado se a anistia incluiria também aqueles que ainda não foram condenados, ele respondeu considerar um absurdo análises que tinham chegado a ele de que seria inconstitucional anistiar pessoas não condenadas.

O requerimento de urgência foi feito em projeto de lei apresentado pelo então deputado Major Vitor Hugo (PL-GO), ainda em 2022, com foco original em anistiar participantes dos atos em rodovias e em frente a quarteis.

Ele prevê “anistia a todos os que tenham participado de manifestações em qualquer lugar do território nacional do dia 30 de outubro de 2022 ao dia de entrada em vigor” da lei. A esse texto estão apensadas outras seis propostas.

O advogado e professor de direito penal da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) Frederico Horta aponta que, caso se adote redação como no substitutivo da CCJ, Bolsonaro estaria incluído. “A lei da anistia vai estabelecer um universo de pessoas conforme o tipo de imputação e conforme uma delimitação de tempo”, diz ele, destacando que a proposta abarcava também atos anteriores ao 8 de janeiro.

Horta afirma ainda que a anistia não se restringiria a pessoas que já foram condenadas —diferentemente de instrumentos como o indulto e a graça—, abarcando inclusive pessoas que ainda não foram processadas ou denunciadas. Ele diz considerar, porém, que, no caso concreto, a proposta possivelmente seria declarada inconstitucional.

noticia por : UOL

15 de abril de 2025 12:13

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